O vento forte chegou de repente, trazendo
folhas do benjamim. Entre as folhas secas, os passos lentos do deambulante
poeta de alma livre.
O poeta chegou com o vento. Com a fúria
do tempo, contemplou as capas de revistas masculinas. Não comprou nada. Apenas
olhou em silêncio os sorrisos mecânicos. Seguiu na direção de seu escritório.
O homem trôpego caminhou devagar. Em
silêncio, caminhou entre as pessoas. Com a boca muda, mastigava as palavras.
Ele se vestia com elegância, calça, camisa, casaco e sapatos usados. O viajante sem rumo, poeta galanteador, era solteiro. A vida lhe negou uma mulher. Não tinha filhos. O eterno menestrel não tinha emprego. Vivia no ócio, alimentando-se de poesia. Sem formação superior completa, levava a vida cheia de vícios. No bolso do casaco, além da cachaça, levava muita poesia.
Mário Gomes era seu nome. O poeta da praça. Uma grande dicotomia: nas manhãs era um homem bom, nas tardes um homem mau, nas noites de boemia, apenas um poeta maldito.
Esse homem que afrontava o poder abusivo era
visto por alguns indivíduos como um santo. Outros, no entanto, consideravam-no
um bandido. Para os amigos da praça, era um herói. Para os incrédulos, era o
anti-herói da cidade.
Em silêncio, chegou ao seu escritório, o
velho banco da praça. Era um local aprazível, sob a sombra de um benjamim.
Nesse canto da praça, escreveu seus poemas. Viveu aventuras.
Nessa tarde poética, passou pela praça o
poeta Costa Sena. Sentou-se ao lado de Mário Gomes. Os dois amigos passaram o
resto da tarde conversando.
─ Mário, você tem alguma
preocupação?
─ Meu chapa, minha única
preocupação é não me preocupar com nada.
Depois de uma longa conversa Costa Sena
abraçou o velho amigo. Seguiu seu caminho e deixou o poeta delirando com seus
mil versos imaginados.
No fim da tarde, Mário Gomes comeu um
prato de lagartas e passou a noite inteira defecando borboletas.
Depois da Ave-Maria, como era habitual, o
poeta fechou seu escritório. Fechou-se do mundo. Mergulhou sozinho na sua
desgraça. Tomou um gole de sua cachaça. Acendeu um cigarro e fugiu de si.
O poeta andarilho caminhou pela praça
devagar. Na lentidão do tempo cumprimentou os amigos. Seguiu na direção do
Centro Dragão do Mar.
Ao cruzar a Praça dos Leões, uma senhora
pagou-lhe um lanche.
─ Mário, você é morador
de rua?
O poeta indignado, questionou:
─ A senhora, aonde é que
mora?
Ela respondeu morar numa rua próxima à
Praça.
─ Então, a senhora mora
na rua? Eu não sou morador de rua. Eu moro dentro dos meus pensamentos.
A mulher silenciou. O poeta seguiu seu
caminho. Desceu pela Rua São Paulo, atravessou a Sena Madureira e desapareceu
com o vento.
Conto premiado com
menção honrosa no XXIII Prêmio Ideal Clube de Literatura 2023 – Prêmio José
Teles.
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